Lição de Vida

domingo, 15 de julho de 2012





Goiás Open - Semifinal (6.1), 1.5.2005




[MI Luís Coelho] 

Esta partida, jogada no ritmo de jogo de 1h30 nocaute para cada jogador, foi a primeira do meu mini-match de 2 partidas contra Tiago Navarro pelas Semifinais do Goiás Open, um excitante torneio de sistema eliminatório (meu debut neste tipo de disputa) promovido pelo clube CXNH em Goiânia-GO, bela cidade que se tornou minha nova residência há pouco mais de um mês. Meu adversário não poderia ser mais desagradável para mim, por dois motivos: em primeiro lugar, Tiago Navarro era meu carrasco na época dos torneios juvenis, onde sempre frustrava minhas tentativas de ser Campeão Brasileiro da categoria, título que jamais conquistei (Navarro me derrotou em Pontal do Sul-PR em 1998, torneio vencido pelo agora MI Vinícius Marques e, também, no meu próprio estádio, o Brasília Clube de Xadrez, em 1999, ano em que o MF Ricardo Benares conseguiu o primeiro de seus dois títulos nacionais juvenis). Em segundo lugar, Tiago é, agora, um dos meus alunos nas aulas em grupo que ministro todas as semanas no já citado CXNH, aulas de nível avançadíssimo, dado o elevado nível técnico da turma (integrada por já experientes jogadores de torneios, apesar da pouca idade, como Tiago Navarro, Diego Wilhems, Henrique Câmara, Tiago Batista e Igor Lutz, entre outros fortes participantes). O hexa-campeão brasiliense Adriano Valle, meu ex (e único) professor, me alertou antes do match sobre os incovenientes de se enfrentar um aluno em partidas de campeonato, os quais ele já experimentou inúmeras vezes em nossos encontros pelas 64 casas. Segundo Adriano, a tarefa é sempre mais fácil para o aluno, que deseja a todo instante provar sua capacidade e mostrar seu progresso diante de seu mestre, enquanto que o professor, que treina e torce avidamente para o aluno, se vê obrigado a usar todo seu potencial para derrotá-lo - ou o derrotado será ele. Ao refletir sobre esta questão, cheguei à conclusão de que, no fundo, é tudo uma questão de se colocar, em primeiro lugar, como um jogador, antes de um professor, e também de ter a certeza que, em caso de vitória do sobre o aluno, o mestre não lhe estará inflingindo mal algum, ao contrário! Tendo isso em mente, sentei-me para jogar altamente disposto e concentrado, determinado a jogar o meu melhor xadrez, especialmente porque eu tinha consciência que eu realmente precisaria demonstrá-lo para eliminar meu adversário, que nos últimos meses conseguiu grandes feitos em partidas de torneios, como suas vitórias sobre os MIs Everaldo Matsuura (no Pré-Olímpico em Belo Horizonte em 2004, partida que foi, em grande parte, responsável pela eliminação de Everaldo das Olímpiadas) e Carlos Alejandro Martinez (no Aberto de Brasília em janeiro/05, uma convincente vitória que deixou todos no salão de jogos perguntando, em tom de admiração, qual dos dois jogadores era o Mestre). Nos últimos meses eu havia enfrentado Tiago por duas vezes: no citado Pré-Olímpico em Belo Horizonte, partida que terminou em empate (trocando em miúdos, Tiago molestou a classificação de dois Mestres Internacionais para as Olimpíadas!), e no também mencionado Aberto de Brasília em janeiro, partida que, de uma forma difícil de acreditar, derrotei Tiago em apenas 14 lances após um erro crasso de meu adversário na abertura devido à sua despreparação teórica na Semi-Eslava. Em relação a este encontro, o fato de que tanto eu como Tiago somos jogadores que dão extrema importância ao aspecto criativo das partidas e temos a parte de cálculo como o ponto forte de nosso jogo (apesar do estilo de Tiago ser mais agressivo que o meu) não me deixava dúvidas que as duas partidas do match seriam qualquer coisa, menos burocráticas e comuns! O que eu não esperava, entretanto, era que meu 12.¤f5!!, um sacrifício (não aceito) de peça, trazia consigo complexidade e beleza tamanhas que eu precisei de cerca de 8 horas de análise com o Fritz8 para descobrir o que, eu quero acreditar, seja a verdade a respeito do mesmo. 

1.e4 

Hoje em dia, por influência do meu constante (e recente) estudo de técnica de finais e xadrez clássico, abro menos partidas com o meu antes onipresente peão do rei, variando bastante com 1.d4, e, às vezes, 1.c4. Mas eu desejava utilizar meu repertório principal nesta partida. [Segue a citada partida contra Navarro em Brasília: 1.d4 d5 2.c4 c6 3.Cf3 Cf6 4.Cc3 dxc4 5.a4 Bf5 6.Ce5 e6 7.f3 c5 8.e4 Bg6 9.Bxc4 Dxd4 10.Bf4 a6?? (¹10...Dxd1+ 11.Txd1 a6 12.Re2©) 11.Db3 ameaçando Td1 e Dxb7. 11...Dd8 12.Dxb7 Cbd7 13.Cxd7 Cxd7 14.0–0–0+- e as negras abandonaram. Coelho,L 2381 - Navarro,T 2150, Aberto de Brasília 2005.] 

1...c6 

Já uma pequena surpresa. Eu definitivamente esperava a Defesa Siciliana, que, em realidade, é mais condizente com o ousado e ambicioso estilo de jogo de meu adversário-aluno. [Eis nossa partida jogada no Pré-Olímpico: 1...e6 2.Cf3 c5 3.d4 cxd4 4.Cxd4 Cc6 5.Cc3 Dc7 6.Be2 a6 7.0–0 Cf6 8.Be3 Bb4 9.Ca4 Be7 10.Cxc6 bxc6 11.c4 c5 12.Dc2 Bb7 13.Bf3 Tb8 14.Tfd1 0–0 15.Td2 Tfd8 16.Tad1 Ce8 17.b4 d6 18.bxc5 dxc5 19.Txd8 Txd8 20.Txd8 Dxd8 21.Cxc5 Bxc5 22.Bxc5 Da5 23.Db1 Dxc5 24.Dxb7 Dxc4 25.Db2 h6 26.Be2 Dc6 27.Db8 Rh7 28.Da7 Cc7 29.h3 e5 30.a4 Dc3 31.Db7 a5 32.Bg4 g6 33.Dc8 Dc1+ 34.Rh2 h5 35.Bd7 Df4+ 36.Rg1 Dc1+ 37.Rh2 Rg7 38.Db7 Df4+ 39.Rg1 Dc1+ 40.Rh2 h4 41.Db6 Df4+ 42.Rg1 Dc1+ 43.Rh2 Df4+ 44.Rg1 ½–½ Navarro,T 2150 - Coelho,L 2401, Pré-Olímpico, Belo Horizonte 2004.] 

2.d4 d5 3.Cc3 dxe4 4.Cxe4 Cf6 5.Cxf6+ exf6 

Esta variante (ao exemplo de 5...gxf6 também) é aquele tipo de linha que todos criticam, mas ninguém sabe refutar! A grande verdade é que 5...exf6 é uma subvariante sólida da Defesa Caro-Kann, que só pode ser explorada pelo jogador das brancas que demonstre um alto nível técnico, particularmente para fazer uso de sua maioria de peões no flanco-dama. 

6.c3 

O plano de desenvolvimento com c3-Bd3-Ce2 é, indubitavelmente, o mais adequado para as brancas contra este sistema. 

6...Bd6 7.Bd3 0–0 8.Ce2 Te8 9.0–0 

[A maioria dos jogadores aqui prefere 9.Dc2 com idéia de responder a 9...g6?! com o agressivo e convincente plano de h4 e 0–0–0. Se as negras, em vez disso, jogam 9...h6, então comprometem sua desejada manobra de Cd7-Cf8-Cg6. Por tais motivos, o lance mais forte para as negras é 9...Rh8!, e a dama branca não está em sua melhor posição em ’c2’. A razão pela qual eu não joguei 9.Dc2 é que eu prefiro manter minha dama em ’d1’ para que ela possa ter acesso ao rei negro pela diagonal d1–h5 (particularmente a casa ’g4’). 9...Rh8! (9...g6?!; 9...h6)

9...Cd7 10.a4! 

Esta idéia do GM israelense Emil Sutovsky se tornou parte integrante de meu repertório após estudar sua excelente vitória sobre o forte GM armeno Karen Asrian em 2003. A idéia é se antecipar ao plano negro de Cf8-Be6-b5-Bd5, com um certo bloqueio no flanco-dama. 

10...Dc7N 

Um lance natural, e também uma novidade. [A citada partida seguiu 10...Cf8 11.Cg3 Be6 12.f4! Dc7 13.f5!? Bxg3 14.hxg3 Bd5 15.Dg4 Dd7 16.Bh6 Cg6 17.Tf4! gxh6? (¹17...De7! 18.fxg6 fxg6÷) 18.fxg6 Dxg4 19.gxh7+ Rh8 20.Txg4± Sutovsky,E 2652 - Asrian,K 2596, Istanbul 2003, 1–0(45).] 

11.Cg3 c5?! 

Navarro decide contra-atacar rapidamente o centro branco, mesmo sem antes tomar todas as precauções necessárias. [Estou seguro que as negras deveriam ter optado por 11...Cf8! , controlando a casa ’f5’, após o que eu iria seguir com 12.f4! com idéia de Df3-Bd2 e somente então decidir entre o plano de ataque no flanco-rei com f4-f5 ou procurar jogar posicionalmente com Tae1–Ce4, procurando fazer uso de minha maioria no flanco-dama em um eventual final.] 

12.Cf5!! 

Este lance, despropositadamente brilhante, foi jogado após cerca de 20 minutos de reflexão. Minha idéia é punir meu adversário por negligenciar a defesa da casa ’f5’ tomando o bispo de ’d6’ e adicionando, assim, a vantagem do par de bispos à da maioria do flanco-dama. 12...Bf8 é refutado por duas variantes muito simples, mas a grande questão para mim era se ele podia jogar 12...Bxh2+ ou não, pois após 13.Rh1 fico ameaçando g2-g3 ganhando uma peça, mas ele pode retornar o bispo com 13...Bd6 e, naturalmente, sou totalmente obrigado a sacrificar o cavalo em ’g7’. É claro que eu calculei um bom número de variantes com este sacrifício sobre o tabuleiro, mas a complexidade do mesmo é tão absurda que estou convencido que nem Kasparov nem o mais potente computador de xadrez seriam capazes de calcular à perfeição as complicações resultantes do sacrifício a partir dessa posição, de forma que minha decisão de sacrificar o cavalo foi tomada por 1/3 de cálculo, 1/3 de intuição e 1/3 de coragem! 

12...Bxh2+? 

Para minha surpresa, Navarro fez este lance, que seguramente é um grave erro, rapidamente. [A melhor decisão para as negras é simplesmente 12...cxd4! 13.Cxd6 (Aqui o sacrifício de peça não funciona: 13.Cxg7? Rxg7 14.Dg4+ Rf8 15.Bh6+ Re7 16.Tae1+ Ce5 17.Dh4 Be6–+ comparem esta variante com a linha 12...Bxh2+ 13.Rh1 Bd6 14.Cxg7 Rxg7 15.Dg4+ ¢f8.) 13...Dxd6 14.cxd4² e as brancas têm uma pequena, ainda que consistente, vantagem. Apesar do par de bispos e do virtual peão de vantagem em ’d4’, a posição negra é sustentável devido ao forte bloqueio que exercem sobre a casa ’d5’, especialmente após o subseqüente plano de Cb6-Cd5-Be6-Tad8; 12...Bf8? 13.Ch6+! gxh6 (13...Rh8 14.Cxf7+ Rg8 15.Dh5 g6 16.Bxg6 hxg6 17.Dxg6+ Bg7 18.Bh6+-) 14.Dg4+ Rh8(14...Bg7 15.Bxh6+-) 15.Df5+-] 

13.Rh1 Cf8? 

Que pena! Após um bom tempo de reflexão, Navarro, bem ao seu estilo, ao invés de aceitar o sacrifício, decide sacrificar uma peça ele mesmo! [Eis as análises que me tomaram cerca de 8 horas, mesmo tendo sido feitas, em sua grande maioria, com a ajuda do competente programa de análise Fritz8: 13...Bd6 14.Cxg7!! tão brilhante quanto forçado (Obviamente não funciona 14.Dg4? pelo simples 14...g6µ; Tampouco funciona 14.Bh6? por 14...g6! 15.Cxd6 Dxd6 16.Te1 Td8!µ defendendo a primeira fila.) 14...Rxg7 não há outro 15.Dg4+ Rh8 esta é a posição crítica, que considero uma das mais complicadas que já tive em minhas partidas em toda a minha carreira. (Ainda no tabuleiro pude ver que o mais natural 15...Rf8?! perde com facilidade: 16.Bh6+ Re7 17.Tfe1+ Ce5 (17...Rd8 18.Txe8+ Rxe8 19.Te1+ Rd8 20.Dg8++-) 18.Dh4 Be6 19.dxe5 Bxe5 20.f4! Bd6 21.f5! (21.Bc4!?‚) 21...Bg3 22.Dg4 Bxe1 23.Txe1 Tg8 24.De4 Dc6 25.Dxc6 bxc6 26.fxe6 fxe6 27.Bc4+-) 16.Dh4!! este é o único lance que promete um ataque forte para as brancas. A idéia é atacar, ao mesmo tempo, ’h7’ e ’f6’, ao passo que a dama fica longe do raio de ação do molesto Bc8. 
a) O aparentemente ganhador 16.Df5? falha por 16...Cf8 17.Dxf6+ Rg8 18.Bh6 Ce6 19.d5 Be5! 20.Df5 Cf8µ e as negras defendem tudo!; 
b) Tampouco funciona 16.Bh6? por 16...Tg8 17.De4 f5!! (17...Tg6?? 18.De8+ Tg8 19.Dxf7 Cf8 20.Dxf6+ Tg7 21.Bxg7+ Dxg7 22.Dxd6+-) 18.Dxf5 Tg6 19.Be3 (19.Dxf7? Txh6+ 20.Rg1 Bh2+ 21.Rh1 Bg1+! 22.Rxg1 Dh2#)19...Ce5–+; 16...f5!! Espetacular recurso do monstro de silício, que eu confesso que não compreendi à primeira vista, porém, após algumas horas analisando a posição, descobri o incomum mistério que circunda essa posição, o qual divido com o leitor agora: o ataque das brancas sobre o desprotegido rei negro é baseado em duas casas, ’g7’ e ’h7’. Se as brancas atacam a casa ’h7’ diretamente, as negras se defendem com Cf8, e, se atacam ’g7’, as negras contestam convincente com Bf8, e o ataque branco sempre falha à causa de um tempo. O que fazer então? A resposta é fascinante: as brancas devem fazer "lances úteis de espera", para contestar a Cf8 com um ataque imediato sobre ’g7’, e a Bf8 com um ataque sobre ’h7’. Estes lances úteis tomam forma no plano de Bg5-Tae1, simplesmente trazendo mais uma poderosa peça para o ataque, ao passo que as negras são incapazes de lutar pelo controle da coluna ’e’, devido à inatividade da torre de ’a8’. Analisando, então, em um nível mais profundo, a falta de desenvolvimento do Bc8 é a grande responsável pelo sucesso do ataque das brancas. (Aqui o natural 16...Cf8? perde devido ao inesperado e espetacular recurso para as brancas no lance 18, encontrado instantaneamente pelo Fritz, e obviamente omitido por mim durante a partida: 17.Bh6! Ce6 (A última variante que fui capaz de calcular ao jogar 12.Cf5 (e que me decidiu a efetuar o sacrifício) foi: 17...Rg8 18.Bxf8 Rxf8 19.Tae1! Tanto nesta como em várias outras posições decorrentes deste sacrifício, o segredo do sucesso do ataque branco é o domínio da coluna ’e’ com suas torres, impedindo a fuga do rei negro. 19...Te6 20.d5 Txe1 21.Txe1 Be5 22.f4 Bxf4 23.Dxf6+-) 18.dxc5!! E as negras não possuem uma única recaptura plausível! (18.Bg7+?? Rxg7 19.Dxh7+ Rf8–+; 18.Dxf6+? Rg8 19.d5 Be5 20.Df5 Cf8µ; 18.Bxh7? Rxh7 19.Bg5+ Rg8 20.Bxf6 Cg7 21.Dg5 Bf8–+) 18...Be5 (18...Dxc5 19.Be3!+-; 18...Bf8? 19.Bg7+! Rxg7 20.Dxh7#; 18...Bxc5 19.Bf4!+-) 19.f4!+- recuperando a peça com ataque de sobra.) 17.Bg5!! Desenvolvendo o bispo para uma casa extremamente útil (pois agora ele tem a flexibilidade de se deslocar para ’h6’ ou ’f6’, conforme o ataque demandar) e preparando a invasão da coluna ’e’. (O automático 17.Bxf5? , atacando diretamente ’h7’, falha por 17...Cf8 18.Df6+ Rg8 19.Bh6 Ce6 20.Bxe6 fxe6 e a dama negra defende ’g7’. As brancas não têm nada melhor que repetir lances com 21.Dg5+ Rh8 22.Df6+ Rg8 23.Dg5+=; Tampouco funciona o ataque direto a’g7’ com 17.Bh6? por 17...Bf8µ) 17...Te6!! Este lance maravilhoso não é considerado o melhor pelo Fritz, nem tampouco foi encontrado por mim. Quem me chamou a atenção para a possibilidade deste recurso defensivo foi o talentoso enxadrista carioca Diego di Berardino, enquanto analisávamos a partida juntos pelo Internet Chess Club. A idéia é defender a terceira fila com a torre, oferecendo de bom grado a qualidade em troca da diminuição do poder ofensivo das brancas. 
a) 17...Cf8? perde devido ao mencionado anteriormente: as brancas esperam a realização deste lance para promoverem um ataque direto sobre ’g7’: 18.Bf6+ Rg8 19.Dh6 Ce6 20.Bxf5+- o ataque subitamente é transferido para ’h7’ e as negras não têm como evitar 21.Bxh7#.; 
b) 17...Bf8? é refutado facilmente pelo ataque direto a ’h7’ com 18.Bxf5 h6 19.Bxh6+-; 
c) Segundo Fritz8, o melhor recurso defensivo é 17...Rg8!? retirando o rei da diagonal a1–h8 e possibilitando uma eventual fuga para o flanco oposto. Mas a verdade é que o brilhante recurso ’humano’ do sacrifício de qualidade com 17...Te6!! de Diego di Berardino é mais forte que a tentativa de se apegar a bens materiais de Fritz8, como o comprovam as variantes a seguir: 18.Tae1! (Novamente o ataque direto a ’h7’ com 18.Bxf5? perde de imediato para 18...Cf8–+ e as negras consolidam sua posição.) 18...Te6! Este lance contém uma idéia muito sutil: obrigar o jogador das brancas a jogar 19.d5, fechando a diagonal a2-g8. (18...Txe1? 19.Txe1 f6 20.Bc4+! Rg7 21.Dh6+ Rh8 22.Te8++-; 18...Tf8 19.Bxf5+-) 19.d5! (Atacar diretamente ’h7’ não funciona novamente: 19.Bxf5? Cf8 20.Bxe6 Bxe6 21.Dh6 Cg6!÷ (21...Be7? 22.Bxe7 Dxe7 23.d5+-) ) 19...Txe1 
c1) 19...Te5 20.Bh6! Bf8 (20...Cf8 21.Df6+-) 21.Dg3+ Rh8 22.Bxf8 Cxf8 23.Dxe5++-; 
c2) Também é possível manter a torre como peça defensiva com 19...Tg6 mas ainda aqui as brancas conseguem vencer, fazendo uso de variantes que, de tão lindas e incomuns, chegam a ser quase inacreditáveis: 20.Bxf5 Cf8 21.Bxg6 fxg6 (21...Cxg6 22.Te8+ Bf8 23.Bh6!!+-; 21...hxg6 22.Te8 Dd7 23.Bf6!+-) 22.Te8 atacando ’f8’ e impedindo o desenvolvimento do Bc8. As negras têm dois planos possíveis, um é o natural b6-Bb7 e o outro, de sofisticação extrema, é defender a torre de ’a8’ ao passo que contra-atacam com 22...Df7! (Perde mais fácil 22...b6?! 23.Tfe1 Bb7 (23...Df7 24.c4! Bb7 25.T8e7 Bxe7 26.Txe7+-) 24.T8e7! Bxe7 25.Txe7 Dd6 26.Bf6+-) 23.Tfe1 Dxd5 ameaçando o espetacular contra-ataque Bh3!! 24.f3!! em uma maluca posição de ataque, um lance profilático de peão! (24.Bh6? Bh3!! 25.Txf8+™ (25.Dxh3?? Txe8–+ …26.Txe8 Dd1+ 27.Te1 Dxe1#; 25.Txa8?? Dxg2#) 25...Txf8 26.Dxh3 Txf2 27.Te8+ Bf8 28.Txf8+ Txf8 29.Bxf8 Rxf8 30.Dxh7=) 24...b6 defendendo a torre de ’a8’ e possibilitando, finalmente, o desenvolvimento do Bc8, o "pior jogador da partida". 25.Dh6 Be6 (Novamente as negras são incapazes de defender sua sétima fileira após 25...Bb7 26.T8e7! Bxe7 27.Txe7 Dd1+ 28.Rh2 Dd6+ 29.f4+-) 26.c4!! desviando a dama da defesa do Be6 (26.Bf6? Rf7 27.Txa8 (27.Te7+? Rxf6 28.Dg7+ Rg5–+) 27...Dxa8 28.Dg7+ Re8µ) 26...Dc6 27.Bf6! Rf7 28.Te7+!! colocando o rei negro na pista de dança. 28...Rxf6 (28...Bxe7 29.Dg7+ Re8 30.Dxe7#) 29.Dg7+ Rg5 30.T7xe6! (30.Te5+? Bxe5 31.Dxe5+ Bf5 32.Dg3+ Rf6 33.De5+=) 30...Cxe6 31.Txe6 Te8 32.Df6+ Rh5 33.Txd6 Dc8 (33...Dc7 34.g4+ Rh6 35.Df4+ Rg7 36.Txg6++-) 34.g4+ Rh6 35.Td5!! a última finesse: as negras não têm meios para impedir Th5#. 35...Te1+ 36.Rg2 Te2+ 37.Rh3 De6 38.Th5#; 20.Txe1 f6 agora as brancas não têm mais o desejável recurso de Bc4+ (Ao analisar esta posição acreditei sinceramente que as brancas estavam perdidas após 20...Cf8 , com idéia de Bd7, consolidando sua posição. Porém, meu grande amigo e companheiro das madrugadas, Fritz8, novamente fez por merecer minha amizade ao me mostrar que as brancas estão ganhas com um inesperado recurso: 21.Bd8!! Db8 (21...Dd7 22.Bb5 Cg6 23.Df6+- e mate na dama!)22.Dg5+ Cg6 23.Te8+ Bf8 24.Be7!+-) 21.Te8+ (Pela décima vez, atacar ’h7’ diretamente perde: 21.Bxf5? Cf8–+)21...Cf8 (21...Rf7?? 22.Dh5+ Rg7 23.Bh6#) 22.Bxf6 as brancas têm uma peça a menos mas as negras seguem sem poder desenvolver seu bispo, ao passo que têm de lidar com as desagradáveis idéias de Dg5+ das brancas. 22...Df7! (22...Rf7? 23.Bd8!! olha o Bd8 de novo! 23...Dd7 e agora, senhoras e senhores, aquele que é, talvez, o lance mais bonito e inesperado, dentre todos os outros, nessas variantes insanas: (23...Db8 24.Dh5+ Rg7 25.Dg5+ Rf7 (25...Cg6 26.Df6+ Rh6 27.Te3! f4 28.Bxg6 hxg6 29.Dh8#) 26.Te7+ Bxe7 27.Dxe7+ Rg8 28.Bc7!+- Mate na Dama 2 - A Missão) 24.Te6!! simplesmente ameaçando Df6+ e Txd6, recuperando a peça e continuando o ataque. 24...Cxe6 (24...Rg8 25.Dg5+ Cg6 26.Bb5!+-) 25.dxe6+ Dxe6 (25...Rxe6 26.Bc4+ Re5 27.Bf6#) 26.Bc4!+- ganhando a dama. Tudo dá certo para as brancas!) 23.Dg5+ Dg6 24.Bxf5 Bxf5 25.Dxg6+ Bxg6 26.Txa8 a6 27.Ta7+- E o final com desbalanço material de Torre + 3 peões x Bispo e Cavalo é ganho para as brancas. Naturalmente as negras não podem jogar 27...b6?? por 28.Tg7+ Rh8 29.Txg6#; 18.Bxf5 (O grande detalhe por trás de 17...Te6 é que agora as negras podem jogar Cf8 tranqüilamente, pois o ataque direto a ’g7’ não funciona mais: 18.Tae1? Cf8! 19.Bf6+ Rg8 20.Dh6 Txf6! 21.Dxf6 Bd7µ) 18...Cf8! (Defender ’h7’ com 18...Tg6? atrasando ainda mais o desenvolvimento da ala da dama e cedendo a coluna ’e’, perde rapidamente: 19.Tae1 Rg7 (19...Cf8 20.Bxg6 fxg6 21.Be7 Bf5 22.Df6+ Rg8 23.Bxd6+-) 20.Bxg6 fxg6 21.Be7 Rg8 22.Te6!! Bxe7 23.Txe7 h5 24.De4+-) 19.Bxe6 fxe6! esta é a melhor posição que as negras podem conseguir depois do sacrifício do cavalo em ’g7’: as brancas perderam seu bispo de casas brancas, uma das peças mais importantes em seu ataque, e o segundo jogador se encontra apto a consolidar sua posição já no próximo lance, ao terminar seu desenvolvimento com 20...Bd7. Parecia-me pouco provável que as brancas conseguissem preservar sua iniciativa aqui, e eu maldizia Diego di Berardino por isso, mas felizmente, meu Salvador, Fritz8, me mostrou que as brancas continuam com um ataque muito forte com 
a) 19...Cxe6? 20.Bf6+ Cg7 (20...Rg8 21.Dg4+ Rf8 22.d5!+-) 21.Dg5 Bf8 22.Tae1 Be6 23.Te3!+- com idéia de Tg3; 
b) 19...Bxe6?? 20.Bf6+ Rg8 21.Dh6+-; 20.dxc5! abrindo a coluna ’d’ para a torre de ’a1’ com ganho de tempo. 20...Bxc5! (20...Dxc5?! desprotege a sétima fila e é refutado com menos dificuldade: 21.Tad1 Bd7 (21...Cg6 22.b4!! Dc7! 
a) 22...Cxh4? 23.bxc5 Bxc5 24.Bxh4+-; 
b) Eis a variante mais complicada de todas após o sacrifício de peça em ’g7’: 22...Df5? 23.Dd4+ Be5 24.Dd8+ Rg7 25.f4! h6 (25...Bf6 26.Dc7+ Ce7 27.Bxf6+ Dxf6 28.Tf3 Rf7 29.Td8‚) 26.fxe5 Dxg5 27.Dc7+ De7 28.Dxe7+ Cxe7 e aparentemente as negras se defendem, mas as brancas ainda conseguem impedir que elas terminem seu desenvolvimento com o forte 29.Td3! ameaçando o arrasador Tg3+, de forma que Cf5 é forçado. 29...Cf5 30.Tf4! ameaçando Tc4 e Td8, ganhando o bispo 30...b6 31.Td8 Rg6 (31...Bb7? 32.Td7++-) 32.Tg4+ (32.Tc4?? Bb7³)32...Rh5 33.Tgg8 Ce7 34.Tge8+-; 23.Dd4+ Be5 24.Bf6+! Raio-X! 24...Rg8 (24...Bxf6 25.Dxf6+ Rg8 26.Td8++-)25.Bxe5 Dxe5 26.Dc4! Ce7 27.Td3!‚ com idéia de Tfd1 e/ ou Tg3, e as negras não conseguem terminar em paz seu desenvolvimento.) 22.Bh6 Be7 23.Dg4 Bf6 24.Bxf8 Txf8 25.Txd7+-) 21.Tad1 Bd7 as negras finalmente conseguem respirar aliviadas e terminar seu desenvolvimento, porém, seu rei será levado novamente ao centro do tabuleiro com 22.Bf6+ Rg8 23.Dg5+ Rf7 (23...Cg6 24.Txd7! Dxd7 25.Dxc5±) 24.Dg7+ Re8 e após 25.Td3!‚ com idéia de Tfd1, as brancas continuam com um forte ataque. Acredito firmemente que esta é a melhor posição possível para ambos os lados após jogo perfeito a partir do sacrifício de cavalo no lance 14. Caso o leitor encontre alguma melhora nas variantes, para qualquer lado, eu agradeceria o feedback. Por enquanto, prefiro acreditar que as análises estão perfeitas. A 13...g6 eu planejava responder com o simples 14.g3 gxf5 15.Rxh2± com uma colossal vantagem.] 

14.g3! 

Quem entra na chuva... 

14...Bxf5 15.Bxf5 Bxg3 16.fxg3 cxd4 

Navarro tomou em ’d4’ provavelmente por recear 16...Dxg3 17.dxc5, mas este lance abriria as duas colunas para as torres negras, e as brancas, ainda sem terminar seu desenvolvimento, poderiam ter alguns problemas para resolver. [A 16...Dg3 eu planejava contestar 16...Dxg3 17.Bf4! (17.dxc5?! Dh4+ 18.Rg2 Tad8©) 17...Dh4+ 18.Bh2 Tad8 19.d5+- com idéia de d5-d6, e o peão passado branco decidirá a partida.] 

17.cxd4 Dxg3 

Esta é a posição básica após o sacrifício de peça de Navarro com 13...Cf8: as negras contam com equilíbrio material (peça x 3 peões) e o rei branco não conta com um peão em seu roque sequer. Ademais, a posição da dama negra em ’g3’ parece ameaçadora. Entretanto, afirmo com toda a segurança que esta posição já é ganha para as brancas, e eu tinha conhecimento disso durante a partida: sua peça de vantagem, em especial seu poderoso par de bispos, irá falar mais alto assim que o peão passado de ’d4’ começar a avançar. Com a disposição ideal de Bf4-Bh3, os bispos brancos estão seguros e defendem seu peão passado até a sétima fileira. Em relação à segurança de meu rei, ele será competentemente protegido pela ação coordenada de minhas peças, e o mecanismo é relativamente simples: as brancas irão situar todas as suas pesadas em casas brancas, de forma que, assim, a diagonal a8-h1 estará sob controle, bem como a terceira fileira. 

18.Ta3! Dd6 19.d5! 

[19.Bf4?? Dd5+–+] 

19...Tad8 20.Td3+- g6 

[20...Cg6 21.Bxg6 hxg6 22.Bf4 Db4 23.b3 g5 24.Bh2+-] 

21.Bf4! 

[21.Bh3? Te4!± impedindo Bf4.] 

21...Db6 22.Bh3 Dxb2? 

Este lance otimista apressa a derrota das negras [¹22...f5] 

23.Bc7! 

A torre negra tem todas as suas casas decentes de fuga sob domínio branco. 

23...Txd5? 

Navarro viu uma idéia de entregar a torre para capturar o peão passado e mais uma peça menor das brancas, mas sua idéia falha por tática. [23...Ta8 24.d6 De5 25.Bg2+-] 

24.Txd5 Dc3 

Aqui eu tinha consciência que o simples 25.Df3 Dxc7 26.Dxf6 ganha facilmente, mas eu calculei uma variante que me garantia a manutenção do material de vantagem (Torre e Bispo x 5 peões) 

25.Bd7! Te7 

Ameaçando Txd7 e Dh3+. [25...Cxd7 26.Txd7 Dh3+ 27.Bh2+-; 25...Te4 26.Bh2+-] 

26.Ba5! 

[26.Bh2?? Cxd7 27.Txd7 Dc6+ 28.Td5 Td7µ] 

26...Dg3 27.Be1 De3 28.Bg4 f5 29.Bf3 

As brancas consolidaram sua vantagem material e aqui eu esperava o abandono de meu adversário a qualquer momento. 

29...Dh6+ 30.Rg1 Ce6 31.Td8+ Rg7 

[31...Cxd8 32.Dxd8+ Df8 33.Dxf8+ Rxf8 34.Bb4+-] 

32.Bc3+ f6 33.Td7 De3+ 34.Tf2 Cg5 35.Txe7+ 

[Aqui ocorreu algo incrível: por cerca de 2 minutos, estive avaliando o lance 25.Dd4, que praticamente força a troca de damas e elimina o esperneio das negras, quando de repente me dei conta que ele responderia 25...Cxf3+! e as brancas são forçadas a abandonar! 35.Dd4?? Cxf3+–+] 

35...Dxe7 36.Bg2 Dc7 37.Dd4 Dg3 38.Dxf6+ Rh6 39.Bd2 

As negras são impedidas de jogar 39...Ch3+ e, portanto, Navarro abandonou. Uma partida da qual estou, sim, orgulhoso do meu jogo, mas que deixa uma pontinha de frustração por eu não ter tido a oportunidade de sacrificar meu cavalo em ’g7’ no lance 14! 
1–0 

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